Exmos. Senhores,
Tenho presente a resposta do(a) representante da Pearle Portugal, Unipessoal, Lda. (MultiÓpticas) à minha queixa. Comentários que se me oferecem:
1. Cito: “A MultiOpticas considera abusivo o comportamento do Reclamante em causa, uma vez que o desconhecimento das condições contratuais desta
campanha procede apenas de culpa exclusiva dele próprio.” [o sublinhado é meu]. Nem mais, nem menos. Fazendo um exame de consciência, a única
culpa que eu me atribuo foi a de ter acreditado que estava a lidar com uma entidade idónea, o que afinal vim a verificar não correspondia à verdade.
E daí o ter elaborado a queixa, para que os meus concidadãos que a lerem pensem, face às posições em presença, se devem tomar precauções especiais
no futuro caso venham a lidar com tal entidade;
2. E por que é que a culpa era minha? Porque, segundo o(a) dito(a) representante, e cito novamente, “… na campanha “Na compra de uns óculos graduados
Receba GRÁTIS o 2º par”, a MultiOpticas esclareceu de forma simples e perfeitamente inteligível os consumidores de modo a não induzi-los em erro, …”
[o sublinhado é meu]. Mas foi exactamente disso que eu me queixei. De que não era clara e de não fui devidamente informado. Era a campanha televisiva em causa, com a actriz Diana Chaves, clara para se perceber que o 2º par grátis não era exactamente igual ao par original? Não! Onde é que eu poderia ter reunido o resto da informação? No acto da compra, através de quem me atendeu. Isso não aconteceu,
como refiro na minha queixa. Não seria o mínimo que o cliente poderia esperar? Se me informaram do limite de preço da armação do 2º par, por que não
fizeram o mesmo quanto às lentes?
3. Para o(a) dito(a) representante, eu deveria ter feito uma investigação preliminar profunda. Ao juntar os prospectos da campanha à sua resposta, quis
mostrar que se o cliente lesse todos os prospectos (muito em especial o último) estaria em condições de ajuizar da real qualidade do 2º par grátis. E está certo.
E se o cliente não tivesse acesso a todos eles? Seria isso justificação para o enganarem? Depois do triste acontecimento, em Dezembro, fui fazer o trabalho
de casa (tarde, é certo!). Fui ao “site” da MultiÓpticas na Internet buscar informação, para ver o que me teria escapado. Nos prospectos que lá estavam
disponíveis – só os três primeiros, nunca antes tinha visto os dois últimos –, naquelas letras miudinhas, apenas se fazia referência ao limite do valor da
armação (informação que me foi fornecida de viva voz na loja) e ao facto das lentes serem “de stock” (não estavam em “stock” as que eu comprei?).
Talvez tenha sido por acaso, mas o facto de o prospecto mais elucidativo sobre a campanha (o último dos que anexou), onde se explica o valor monetário
da oferta, não estar disponível, é sintomático da pouca transparência (se não lhe quisermos chamar coisa pior) da campanha. E, no entanto, a culpa é
atribuída ao cliente por não ter reunido o “puzzle” da informação na sua totalidade. Aliás, faz-me muita confusão pensar que para ter de comprar um
produto “corrente” como um par de óculos terei de gastar horas a documentar-me sobre o fornecedor e suas campanhas publicitárias para reduzir a
possibilidade de ser enganado. Mas tenho de reconhecer, agora, que é a única forma de evitar ser a vítima num “jogo de gato e de rato”;
4. E chegamos à definição de publicidade enganosa, que o(a) dito(a) representante não deixou de fazer constar da sua missiva: “… publicidade que,
por qualquer forma, incluindo a sua apresentação, e devido ao seu carácter enganador, induza ou seja susceptível de induzir em erro os seus destinatários …”.
Qual é a mensagem da campanha que marca o potencial destinatário de modo mais forte? A da televisão. Era esclarecedora? Não. Induzia em erro o
destinatário? Sim. O que podemos, pois, chamar-lhe?
5. É muito simples, na prática, induzir em erro os destinatários, fazendo publicidade enganosa, sem que legalmente se possa ser acusado de violar a
Lei por tal motivo. Fazem-se diversas peças de promoção, a informação constante de cada uma dessas peças é, por si só, insuficiente para que um
qualquer destinatário perceba o teor efectivo da campanha, mas no conjunto a informação está toda lá. A peça que é mais esclarecedora, o acima
mencionado último prospecto, pode tornar-se, por acaso, de circulação restrita, nem estando afixada nas lojas, nem sendo acessível no “site” da empresa.
Estão reunidos os ingredientes: em teoria está tudo disponível; na prática não. A culpa é do cliente?
6. Para o(a) dito(a) representante o cliente é um “malandro que quer difamar” a empresa, tendo tido “comportamento abusivo” porque se queixou.
Que cada um pense por sua cabeça: seria de esperar que um cliente que tivesse sido devidamente informado no acto da compra iria posteriormente gastar
tempo e paciência a insurgir-se contra a empresa? Por que razão o(a) representante da empresa não refere, na sua argumentação, que o cliente foi
devidamente informado no acto da compra pela funcionária que o atendeu?
Encerro estas considerações agradecendo ao Portal da Queixa a oportunidade que me proporcionou de fazer eco de uma situação que, julgo, pode aproveitar
como formação e informação para que os consumidores estejam mais atentos às propostas das entidades com quem se relacionam nas transacções que efectuam.
Lamento que o Portal da Queixa não tenha escapado incólume a uma investida por parte do(a) representante da empresa, apenas porque abriu o seu espaço
de divulgação a ambas as partes, para que apresentassem os respectivos argumentos.
Paguei para aprender uma lição. Assim é a vida. Tive como ganho inesperado o ter vivido uma situação que deu um óptimo caso de estudo para discutir com
os meus alunos de pós-graduação.
Com os cumprimentos do
José A. C. Moreira.
Para deixar o seu comentário tem de iniciar sessão.