Opinião: Os eleitores evoluíram. Os políticos, não!

Em primeira análise, uma campanha política, seja autárquica ou de outra circunstância qualquer, tem como principal objetivo alcançar o melhor rácio de conversão de eleitores possível. Ora, em nada se demarca do objetivo mais básico que uma campanha de marketing pode ter. Vender, vender, vender!

Opinião: Os eleitores evoluíram. Os políticos, não!

Na mesma semana em que começou a disputa política, por via dos debates eleitorais, - onde cada um dos candidatos tenta convencer os cidadãos de que o seu programa é a solução para os problemas do concelho onde estes residem, - foi apresentado um estudo por parte do Portal da Queixa, concluindo que as reclamações dos munícipes dirigidas às autarquias tinham quadruplicado este mandato, comparativamente com o mesmo período do mandato anterior. A primeira reflexão que fiz, para além da estupefação que me bloqueou o pensamento por alguns minutos, foi sinceramente, "o que andam os políticos portugueses a fazer?!".

Em primeira análise, uma campanha política, seja autárquica ou de outra circunstância qualquer, tem como principal objetivo alcançar o melhor rácio de conversão de eleitores possível. Ora, em nada se demarca do objetivo mais básico que uma campanha de marketing pode ter. Vender, vender, vender!

Nesta matéria, a reputação é a chave para o sucesso. Sem a confiança necessária, o comprador desconfia do produto ou do vendedor e não avança para a compra.

Enquanto seres humanos, a primeira coisa que nos atraí é a emoção, e nesse domínio a política é feroz, pois nada melhor do que assistir a um discurso político no cimo de um púlpito, para se sentir o fervor pelo poder. Por isso, vamos fazer um pequeno exercício de comparação entre o que um marketeer necessita para conhecer o seu público-alvo e o que um político deveria saber sobre o seu eleitorado indeciso.

Para melhor entender o comportamento do consumidor/eleitor, precisamos conhecer os fatores que o influenciam. Então, quais são os principais indicadores de confiança que motivam a compra ou neste caso em específico — o voto?

  1. Papel sociocultural

A importância do papel sociocultural refere-se aos grupos a que a pessoa pertence, através dos círculos sociais que frequenta, a profissão exercida, a família da qual faz parte e os seus relacionamentos de amizade. Este aspeto considera o “mundo” que o indivíduo pertence e com o qual este interage diariamente. Por exemplo, é fundamental conhecer sobre o quanto é importante, para os consumidores, que as marcas ergam bandeiras sobre determinadas causas e que tenham um papel socialmente ativo. Da mesma forma, é crucial para o candidato conhecer realmente as motivações do seu eleitorado, para ir ao encontro das suas expectativas.

  1. Medos e necessidades

Fatores do foro psicológico e emocionais podem impactar diretamente com os hábitos de compra dos consumidores, seja pelo trauma de uma experiência negativa, seja pela necessidade ou até mesmo por algum tipo de preconceito. Por exemplo, algumas pessoas têm receio de fazer compras online e serem vítimas de fraude. Por isso, optam por se dirigir às lojas físicas. Por outro lado, há aqueles que sentem necessidade de aceitação social e, para isso, fazem o possível para comprar online marcas de moda famosas, independentemente do preço pago e partilhar o feito nas redes sociais. Ambos, são claros exemplos de fatores psicológicos que influenciam o comportamento do consumidor.

No domínio político, é essencial identificar o objetivo da ação, para combater potenciais problemas e satisfazer as necessidades mais evidentes, como por exemplo, o medo de circular ou residir em determinadas artérias das cidades, por medo de assaltos ou violência, ou pela perda de habitação devido à especulação imobiliária. Por sua vez, a dificuldade em satisfazer as necessidades mais básicas podem constituir motivos dissuasores, nomeadamente com a desertificação dos meios rurais, onde cada vez mais escasseiam os serviços essenciais.

  1. Experiência e literacia

Todos nós, passamos por várias fases durante a vida, sendo que, cada estágio que vivenciamos diferentes tipos de experiências, vão influenciando a forma como olhamos o universo que nos rodeia. Dependendo da etapa em que estamos, as nossas prioridades e hábitos de consumo vão mudando drasticamente, oscilando conforme cada ciclo de experiências que vivemos. Portanto, podemos afirmar que cada faixa etária do eleitorado tem ideais diferenciados, da mesma forma que os consumidores têm interesses ajustados à sua idade.

Como exemplo de mudança dos tempos, podemos olhar para a geração Y, que ainda tem muitos estágios da vida para experimentar, mas já tem opinião formada sobre os diversos temas mais relevantes para a sociedade, que facilmente obtêm através do fácil acesso à informação e conhecimento. Nos dias de hoje, não estar informado é uma opção e não uma condição.

Em suma, podemos facilmente verificar que tantos os consumidores como os eleitores, procuram influências sólidas que mudem o seu estado comportamental, com vista a melhorarem a sua qualidade de vida, interesses e literacia, de modo a facilitar a solução dos seus problemas, por via da opinião resultante da experiência de outros. Esta é uma aprendizagem básica no ensino do marketing, onde conhecer o target é um fator essencial para atingir os resultados pretendidos.

Este resultado pode ser caracterizado igualmente como evolução comportamental, onde o indivíduo procura retirar benefícios através da experiência, para obter a melhoria contínua.

Contudo, observando o comportamento político dos candidatos, das suas ações de campanha em cartazes de rua, dos argumentos apresentados em debate e, principalmente, pelo resultado do aumento da insatisfação do seu eleitorado, questiono se teremos condições para afirmar que essa evolução está presente na mesma medida? Não estará de certeza, pois é evidente e recorrente a utilização de uma estratégia de campanha política padronizada, obsoleta e sem consequência, que apenas resulta no desconhecimento total das necessidades dos munícipes, resultando em apenas mais reclamações a cada ano.

(publicado originalmente na Revista Exame)


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