Opinião: Preços apetecíveis nos marketplaces internacionais são sinónimo de “dor de cabeça”

Aquilo que à partida, parece ser mais um benefício da globalização digital - pelo fácil acesso a produtos de vestuário, tecnologia e eletrónica, com descontos consideráveis e raramente disponíveis em lojas físicas no território nacional -, nem sempre resulta num bom negócio para uma grande parte dos compradores em Portugal.

Opinião: Preços apetecíveis nos marketplaces internacionais são sinónimo de “dor de cabeça”

Por Pedro Lourenço, CEO & founder do Portal da Queixa by Consumers Trust e embaixador da Comissão Europeia para os Direitos do Consumidor

Ofertas de produtos a preços mais vantajosos, através dos markeplaces internacionais como a Amazon, a Shein e o Aliexpress, têm-se revelado uma dor de cabeça para os consumidores portugueses. Devido às más experiências na entrega das encomendas e pelo difícil acesso aos canais de apoio aos clientes, os níveis de confiança em plataformas de e-commerce internacionais, têm registado baixos índices de satisfação no Portal da Queixa.

Portugal ainda está muito longe dos números de utilizadores de plataformas de comércio eletrónico de venda de produtos por terceiros, mais conhecidas como "marketplaces", comparando-o com os restantes países da Europa ou até mesmo o Brasil, que regista níveis de preferência muito elevados pela compra online em detrimento das lojas físicas, de acordo com a pesquisa realizada pela All iN | Social Miner, em parceria com Opinion Box e Etus, que revela que metade dos consumidores brasileiros prefere lojas online às lojas físicas.

Aquilo que à partida, parece ser mais um benefício da globalização digital - pelo fácil acesso a produtos de vestuário, tecnologia e eletrónica, com descontos consideráveis e raramente disponíveis em lojas físicas no território nacional -, nem sempre resulta num bom negócio para uma grande parte dos compradores em Portugal.

Com baixos níveis de literacia digital, a maioria dos consumidores portugueses arrisca a compra em marketplaces, sem conhecerem o conceito que está por detrás destas plataformas, que as desresponsabiliza em matéria de direitos de consumo, nomeadamente as garantias, as condições de troca e devolução. Estas plataformas servem meramente como meios de divulgação de produtos, a troco de uma comissão de venda, não interferindo no processo de compra entre o vendedor e o comprador, o que, em caso de litígio, falta de entrega das encomendas ou até mesmo sendo necessário o apoio pós-venda, os consumidores são redirecionados para o contacto direto com o real vendedor.

Sob a garantia de reputação da marca global, como Amazon, eBay ou até mesmo Aliexpress, os consumidores acreditam que no caso de ocorrer um problema, a marca com tal notoriedade internacional, vai conseguir apresentar uma solução. No entanto, é nesse preciso momento que percebem não terem adquirido na marca que lhes dava garantia de confiança, mas sim, num vendedor total desconhecido que, provavelmente, nem está localizado no mercado europeu, não podendo por isso, exigir o cumprimento legal estipulado pelas diretivas da comunidade europeia.

O governo português, através do secretário de estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, João Torres, viu-se obrigado a reagir tardiamente a este paradigma, ao preparar a transposição de três diretivas europeias, nomeadamente no que toca à compra e venda de bens online e ao fornecimento de serviços e conteúdos digitais, contudo ainda sem efeitos práticos, face à constante entrada de plataformas de comércio eletrónico em Portugal, sem qualquer regulamento e supervisão que garanta a proteção dos direitos dos consumidores. É urgente que o regulamento possa garantir que a plataforma intermediária de venda, assuma a responsabilidade de ressarcir o comprador, no caso em que essa ação seja negada pelo vendedor inicial.

Da mesma forma, é crucial que os consumidores sejam elucidados das diferenças entre comprar diretamente ao vendedor que assume a marca do marketplace ou comprar a um terceiro, que apenas esteja a promover os seus produtos através da plataforma.

Tenho a certeza que, infelizmente, num futuro não tão próximo, continuaremos a assistir a constantes atropelos aos direitos constitucionais dos consumidores portugueses, por inércia dos órgãos competentes, como também pela continuada falta de conhecimento e experiência na utilização de ferramentas digitais.

(publicado originalmente na Revista Exame)


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