Empresas de cobranças de dívidas: reclamações aumentam 210% no primeiro semestre

O Portal da Queixa verificou, no primeiro semestre do ano, um aumento significativo das reclamações dirigidas a empresas de cobrança de dívidas.

Empresas de cobranças de dívidas: reclamações aumentam 210% no primeiro semestre

O total de 180 queixas registadas, entre janeiro e junho de 2018, traduz uma subida na ordem dos 210%, face ao período homólogo de 2017. No Top 10 das empresas com mais reclamadas estão no pódio a Whitestar Asset Solutions, a Servdebt e a Intrum.

 

Empresas de cobrança com maior número de reclamações

N.º reclamações por marca até finais de junho

Empresas

2017

2018

%variação

Whitestar Asset Solutions

2

36

1700%

Servdebt

1

9

800%

Intrum

27

92

241%

Indebt

1

2

100%

Gestifatura

10

14

40%

Logicomer

11

13

18%

Algebra Capital

1

1

0%

Credinformações

1

1

0%

DUO Capital

2

2

0%

Gesphone

1

1

0%

 

 

Por que reclamam os portugueses?

Das inúmeras reclamações apresentadas, a maioria está relacionada com comportamento abusivo/indevido/ameaçador/duvidoso por parte dos cobradores, dívidas já prescritas/pagas/indevidas e cobranças de dívidas desconhecidas ou inexistentes.

Este último motivo de reclamação revela ser um dos mais preocupantes, até porque existem diversos consumidores que afirmam tratar-se de burlas, como é o caso da seguinte mensagem deixada por um consumidor ao Portal da Queixa:

 

«A todos deixo esta lei para quando forem abordados pela Gestifatura com cobranças falsas da EDP, Meo, etc..Não se deixem enganar por fraudes......"Como V.Exas certamente não desconhecem, a Lei dos Serviços Essenciais (Lei nº 10/2013, de 28 de janeiro) estipula que “o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação” e que “o prazo para a propositura da ação ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço ou do pagamento inicial, consoante os casos”.

Face ao exposto, a dívida invocada por V.Exas encontra-se claramente prescrita pelo que, desde já, exijo que o registo relativo à mesma seja eliminado de quaisquer bases de dados e que o meu nome seja retirado da lista de devedores.".....Esta é a lei...basta de chamadas com tentivas de golpe»  - 22 de junho de 2018

 

Como foi possível concluir com os dados acima mencionados, a Whitestar Asset Solutions apresenta-se como a empresa de cobrança de dívidas com maior número de reclamações. Na seguinte mensagem postada no Portal da Queixa, o consumidor aborda uma situação em que lhe foi oferecido um desconto ao pagamento da dívida, mas o problema é que o consumidor não consegue determinar qual o motivo da dívida para a conseguir resolver:

 

“Boa tarde! Recebi hoje uma chamada da minha mãe, que ao atender percebi de imediato encontrar-se bastante alterada!!! Após largos minutos a tentar acalma-la, lá acabou por me dizer que tinha chegado à sua morada uma carta, dirigida a mim, por parte desta empresa, e que julgando tratar-se de algum tipo de propaganda (pois nunca tinha ouvido falar em tal empresa) abriu, e deparou-se com a seguinte informação: “cara senhora, (eu, não a minha mãe) a sua dívida ascende neste momento a 4.000 euros! Aproveite esta oportunidade única e se liquidar a mesma até 31 de agosto beneficiará de um desconto de (penso) 40% e pague apenas 2.000 (e qualquer coisa) euros!!! Só isto!!! Sem mais nenhuma informação... a quem se deve? Desde quando? Porque? A minha mãe passou mal....quatro mil euros?!? A questão aqui é a seguinte, não tenho a mínima ideia que dívida é esta, não moro em casa dos meus pais, nem em Portugal há 12 ANOS, sei que não deixei dívidas em Portugal quando emigrei, pois fi-lo com cerca 24 anos, e o meu telemóvel era pré pago, nunca tive cartões de crédito, nem créditos bancários,e pela pesquisa que fiz a respeito da empresa, fica muito por esclarecer! Solicito a empresa em questão o contacto através de e-mail com informações a respeito da dívida em questão, e informo que entrarei em contacto com o meu representante legal em Portugal, porque não ando cá a dormir, e
sei que, de acordo com o código civil português, à exceção de créditos bancários todas as dívidas têm um prezo de prescrição, entre seis meses a oito anos, decorridos sem que a empresa credora da dívida efetue diligências para obtenção dos montantes em dívida! Peço ainda, a quem tiver sido já contactado pela empresa em questão, que me informem, caso tenha disposição para tal, de que forma decorrem os processos com os mesmo!” - 22 de junho 2018

 

Outro dos grandes problemas associados a estas empresas de cobrança de dívidas, prende-se com a questão da legalidade, uma vez que são facultados dados pessoais às empresas sem o consentimento dos consumidores:

 

“Gostava como esta empresa, que nunca ouvi falar de lado nenhum e que não tenho qualquer compromisso com eles, tem acesso aos meus dados pessoais tais como morada e número de telemóvel? Quem cedeu os meus dados à empresa em questão?” – 26 de maio de 2018

 

 

Respostas das empresas

Na página das empresas – existentes no Portal da Queixa – verifica-se que, a maioria responde, mas nunca apresentam uma resolução.

A única resposta dada encaminha os utilizadores para os próprios canais de resolução, como foi o caso da respostada dada pela Whitestar Asset Solutions a uma reclamação publicada no Portal da Queixa:

 

“A Whitestar Asset Solutions, S.A. - com o número único de matrícula na Conservatória do Registo Comercial e de identificação de pessoa colectiva 508099161 - informa que para apresentar qualquer reclamação deverá usar o canal apropriado disponível em Whitestar (http://whitestar.pt/Site/DataProtection/62/41). Alerta-se que a não utilização dos canais oficiais de entrada de reclamações poderá resultar na não consideração da reclamação apresentada, por razões alheias à Whitestar”.

 

A empresa Servdebt apresenta o mesmo discurso, acrescentando, ainda, que o Portal da Queixa não é o meio adequado para o consumidor apresentar a reclamação:

“A SERVDEBT INFORMA: O Portal da queixa não é o meio adequado para apresentar a sua reclamação. Poderá submeter a sua reclamação diretamente no nosso site –www.servdebt.com ou através do endereço de correio eletrónicoombudsman@servdebt.pt, devidamente instruída com os factos e os seus contactos. A SERVDEBT pauta a sua atuação pelo cumprimento da lei, pela observância de regras de natureza ética e deontológica e, ainda, de procedimentos de gestão da qualidade. Nestes termos, todas as reclamações recebidas serão objeto de análise e resposta. Obrigada. ServDebt, S.A.”

 

Tema discutido na Assembleia da República

Para além de complexo, o tema em questão originou um aumento significativo de queixas, o que o levou a ser discutido na Assembleia da República, facto revelador de que este é um grave problema na vida de alguns portugueses.

Recorde-se que, em janeiro deste ano, três deputados do PS apresentaram um projeto de lei que foi discutido no mesmo mês, como forma de criar um regime para a cobrança extrajudicial de créditos.

De acordo com esta iniciativa, as empresas que se dedicam à cobrança de dívidas fora dos tribunais não poderão utilizar métodos de cobrança e recuperação opressivos ou de intrusão, nomeadamente através de viaturas, indumentária ou matérias de comunicação que, pelo conteúdo da mensagem transmitida, conduza a uma imagem negativa do devedor. Para poderem exercer esta atividade, as empresas terão de preencher um conjunto de requisitos entre eles, assinar um contrato com o credor que as procura, no qual ficará definido e serão identificados todos os envolvidos. O contrato terá de ser mantido por dois anos depois de terminado, para assegurar o controlo e fiscalizações que possam ser necessárias.

As regras deste projeto de lei são mais rígidas no que diz respeito ao contacto das empresas com os devedores. Além dos métodos já referidos, os cobradores não poderão contactar terceiros que não sejam o próprio devedor ou o seu advogado para cobrar a divida. Caso tenham que falar com terceiros para localizar o devedor, não podem de forma alguma divulgar a existência de uma dívida.

Também os contactos para o local de trabalho ficam proibidos, a menos que o consumidor o autorize expressamente. Caso os contactos sejam feitos via telefone, e para efeitos de controlo futuro, todas as chamadas, seja com credores ou devedores, devem ser gravadas.

Outra das regras prende-se com o exercício da atividade. Isto significa que as empresas de cobrança extra-judiciais terão de cumprir um conjunto de requisitos, como ter um código de conduta disponível na internet e dispor de um estabelecimento fixo de atendimento ao público aberto, no mínimo, quatro horas todos os dias úteis. Terão, também, de provar a sua idoneidade através do registo criminal, não podendo ter sido já condenados por crimes como furto, roubo, extorsão, fraude fiscal, entre outros.

Para os infratores está previsto, também, um conjunto de coimas. Se violar a regra que proíbe métodos que possam intimidar os devedores arrisca uma multa que pode ir aos 2.500 euros para os singulares e aos 20 mil euros para empresas. O acesso indevido à atividade pode levar a uma multa máxima de 44 mil euros.

Agora a questão principal é: Quando é que este projeto de lei será aprovado para que os consumidores portugueses deixem de se preocupar com dívidas que não lhes dizem respeito?

 

Notícia atualizada com posição da APERC - 11-07-2018

Ao Portal da Queixa, a Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Recuperação de Créditos (APERC) fez chegar a sua posição relativamente à notícia, referindo que "desde a sua fundação, que a APERC e os seus Associados [24], se têm guiado por um exigente código de ética e deontológico, onde o primado da cidadania, da ética, da urbanidade e do respeito cívico, estão sempre na primeira linha do contacto com os clientes". "De acordo com os Dados de Atividade Consolidados do setor aqui representado e referentes a 2017, temos: Contratos sob Gestão – 3.650.621; Montante sob Gestão – 13.807.997.003 Euro e Valores Recuperados – 640.831.285 Euros".

Segundo os dados disponibilizados no comunicado da APERC, "as 171 queixas referenciadas na notícia que teriam sido apresentadas em 2017, mais não são do que 0,000046% do montante dos Contratos sob Gestão", o que demonstra que o volume de reclamações é muito superior ao que é veículado através da plataforma Portal da Queixa, que apenas representa uma amostra do mercado.

Mais informa que para as empresas associadas, as reclamações são muito importantes e alvo de grande preocupação, contudo avança que "estará sempre atenta ao cumprimento do Código Deontológico e de boas práticas, por parte de todos os seus Associados, mas não nos podemos dissociar que algumas dessas queixas resultam do facto, do devedor não querer ser abordado para uma responsabilidade que assumiu e que, entretanto entrou em incumprimento."

 


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